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quinta-feira, 5 de novembro de 2009

A moda na ponta dos dedos

Deficientes visuais usam o toque para escolher e comprar roupas e sapatos.




Desfile do 1º Encontro Estilo, Elegância e Equilíbrio.


Mesmo se estiver acompanhada, a pedagoga Adriana Barsotti, de 38 anos, que é deficiente visual desde a infância, gosta de decidir sozinha a compra de suas roupas e calçados. Ela faz isso pelo toque. "Gosto de passar a mão, avaliar a textura e o formato. Depois, pergunto as cores. Adoro roupas com pedrinhas e de cores vivas. É pelo toque que decido se levo ou não, independente se estou com alguém", contou a pedagoga da Laramara (instituição que trabalha com deficientes visuais), durante o 1º Encontro Estilo, Elegância e Equilíbrio promovido pela Fundação Dorina Nowill para Cegos.

Foram dois dias do encontro, em São Paulo, com o objetivo de debater a relação entre o mercado da moda e a pessoa com deficiência visual (PDV) como consumidora. Comportamento, etiqueta, estilo e independência do deficiente visual na escolha do produtos e dilemas foram alguns dos temas abordados com oito profissionais renomados do setor.

Segundo a presidente emérita e vitalícia da fundação, Dorina de Gouvêa Nowill, de 90 anos, a proposta do evento, inédito, foi ampliar o debate em torno das experiências vivenciadas pelos deficientes na hora de ir às compras. "É muito importante que o comércio seja sensível às necessidades e dificuldades da PDV, adequando suas ofertas a um bom atendimento no sentido de ajudá-las a praticar a liberdade de escolha como todo consumidor", disse.

Desafios - Entre os deficientes participantes do evento, algumas dificuldades foram levantadas e debatidas. Entre elas, o acesso às lojas de ruas espalhadas pela cidade, a dependência dos vendedores para localizar o produto do seu gosto e a falta de recursos, como a descrição dos itens de consumo.
"A gente não enxerga, mas usa roupa, calçado e faz tudo usando a percepção. Hoje há muitos recursos e podemos usá-los em benefício daqueles que têm limitações", ressaltou Dorina, que aproveitou o encontro para informar aos palestrantes que o censo de 2000 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registra mais de 2,5 milhões de PDVs no Brasil.

Para a advogada e presidente do Instituto Íris, Thays Martinez, de 35 anos, deficiente visual desde os quatro anos de idade, o maior desafio é o atendimento e deixou um conselho aos lojistas. "A aparência é uma parte importante da vida da pessoa e não abro mão de me vestir bem mesmo dando trabalho para os vendedores, porque há muita gente sem informação e despreparada para atender a PDV. Minha dica aos lojistas é considerar nossas dificuldades, como de acessibilidade, e não misturar a questão de responsabilidade social com o atendimento a pessoas com necessidades especiais".

A diretora-geral da grife francesa Dior no Brasil e presidente da Associação de Lojistas da Oscar Freire, Rosângela Lyra, se comprometeu a repassar os dilemas da PDV aos comerciantes do setor. "Vejo que há uma demanda reprimida e vou levar todas essas questões para a próxima reunião com os lojistas", afirmou.

1º Encontro Estilo, Elegância e Equilíbrio promovido pela Fundação Dorina Nowill para Cegos.


Dicas - As professoras do curso de Moda da FMU, Romy Tutia e Francisca Mendes, que coordenaram o desfile do evento destacaram a importância das combinações de peças. "O universo da moda oferece um repertório volumoso de peças e cada pessoa deve descobrir como combiná-las com o seu look. Procurem ter peças básicas e busquem informações de moda antes de ir à loja", disse Tutia.

O desfile contou uma inédita audiodescrição feita pela especialista Lívia Motta, por meio do qual os deficientes visuais puderam tocar os tecidos, verificar as estampas, texturas e saber das cores e detalhes das roupas, sapatos e dos acessórios, além de tirar dúvidas. O estilista Geraldo Lima da loja Urânio falou da analogia das cores. "A dica é procurar entender as cores, fazendo uma analogia com o estado de espírito e diversificar o guarda-roupa", disse.

Cerca de 200 pessoas participaram do encontro, entre estudantes de moda, estilistas, lojistas além de consumidores com e sem deficiência. "Tudo o que aprendi vai contribuir para organizar melhor o meu guarda-roupa e ficar mais atenta à moda, inclusive para ser melhor atendida nas lojas", concluiu a pedagoga da Laramara.

Geriane Oliveira - Diário do Comércio


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