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quinta-feira, 22 de setembro de 2011

O risco da bola



A visão é um dos mais importantes (senão o mais importante) dos sentidos. Inclusive, todos os atletas hão de convir que enxergar - e bem - faz parte das boas finalizações e do bom desempenho nas atividades esportivas. Durante os dias dos jogos da Copa do Mundo, as lesões musculares, as quedas, as fraturas e até bolhas nos pés foram motivos de problemas para os atletas. Entretanto, há um trauma que ocorre, principalmente com os jogadores de futebol, e que quase sempre não é lembrado: os traumas oculares. Apesar de estarem em quarto lugar em freqüência, após os traumas ocorridos na rua, em casa e no trabalho, o trauma ocular na atividade esportiva, significa uma causa importante, pois representa 25% do total de casos. Nos EUA ocorrem, em média, 100 mil casos de acidentes com os olhos dos atletas por ano, o que representa 14% de todos os atendimentos oculares.

Estudos realizados recentemente no Brasil mostram que 14% dos casos de perfuração ocular que chegam aos pronto-socorros são relacionados a lazer e esporte que envolve contato físico, raquetes, bolas rápidas e esportes aquáticos. A Universidade Federal de Santa Catarina analisou causas de traumas oculares por esporte no ano de 2004 e apurou que 50% foram causados durante partidas de futebol de campo. Estudo da Escola Paulista de Medicina mostrou que o futebol também foi a causa principal de trauma ocular. Em entrevista que realizei com 80 jogadores da Federação Paulista de Futebol, 25 já tiveram algum trauma ocular durante algum jogo.

Problemas de visão entre jogadores de futebol são muito comuns, e há alguns casos clássicos, como do ex-jogador Tostão, hoje comentarista de futebol, que teve sua carreira encerrada precocemente por causa de problemas gerados por um deslocamento de retina. Viola teve uma fratura de órbita. O então técnico da Seleção Brasileira, João Saldanha, ameaçou não convocar Pelé para a Copa de 70, porque ele não estaria enxergando bem. Considerada louca, a dedução de Saldanha foi confirmada somente a poucos anos atrás, quando veio à tona a história de que Pelé é míope dos dois olhos há décadas e, por causa disso, teve um deslocamento de retina, que quase o deixou cego do olho esquerdo.
De 80 jogadores entrevistados, 25 já tiveram algum trauma ocular durante uma partida.

Várias pessoas se lembram do jogador Davids, da Holanda, com seus óculos de proteção, pois realizou cirurgia para glaucoma, o que deixa os olhos mais vulneráveis. Uma coisa é certa e os estudos são claros: 90% dos acidentes oculares em todos os esportes são evitáveis. Portanto, por mais estranho que possa parecer, além das caneleiras, mais um item poderia ser incorporado no arsenal de proteção de jogadores de futebol: óculos. E isso não é nenhum exagero. Em todas as áreas da saúde, prevenir é sempre o melhor caminho. Proteger contra os raios UV e diminuir o desconforto do sol são também benefícios dos óculos de proteção. A exposição constante ao sol pode causar queimaduras na córnea, degeneração na retina, aparecimento de pterígio, além de agravar quadros de catarata. Romário já teve pterígio, uma membrana que cresce sobre o olho e que tem que ser retirada com pequena cirurgia.

Todo trauma ocular deve ser considerado potencialmente sério. Por vezes uma pequena batida nos olhos pode causar danos irreparáveis. Uma das razões para a ausência dos óculos nos jogos são as normas futebolísticas que estabelecem que o atleta não pode entrar em campo com acessórios que possam machucar o adversário. Por isso, a questão do uso obrigatório dos óculos de proteção ainda é motivo de discussão entre as confederações.O oftalmologista pode ajudar o atleta - profissional ou amador - na escolha da correção seja lentes de contato ou óculos, da armação, da lente ideal, que pode ser de acetato especial, no caso das armações e de policarbonato (as lentes), o que tornará o produto altamente resistente a qualquer impacto. Esses óculos também podem ter silicone nas têmporas e no nariz, para não machucar e ter formas arredondadas, o que não causará nenhum mal aos adversários.

O importante é dizer que é possível tratar, de maneira factível, os problemas visuais dos jogadores sem que isso atrapalhe a carreira. Pelo contrário. Esse tratamento vai possibilitar, inclusive, melhora do desempenho dos atletas. O desenvolvimento da visão periférica (ou lateral) permite enxergar o que nos cerca e é essencial para uma boa defesa durante os jogos. Outra dica importante para os jogadores é saber qual é o seu olho dominante, isso por que esse olho transmite informações ao cérebro mais rapidamente e o posicionamento do jogador que mantenha desobstruído o olho dominante lhe possibilitará a chance de boas finalizações.

Os times ficam atentos com a capacidade cardio-respiratória e ortopédica do atleta, mas desconhecem a cultura da boa acuidade visual. Em tempo: um em cada quatro jogadores entrevistados da Federação Paulista nunca haviam feito exame de visão antes.

Usar óculos de proteção para evitar trauma ocular não será uma cultura fácil de se implantar entre os atletas, mesmo enfocando que esses óculos podem proteger dos nocivos raios UV, que podem causar queimaduras na córnea, degeneração na retina, aparecimento de pterígio, além de agravar quadros de catarata. De qualquer forma, evoluir no quesito saúde visual é uma necessidade. É bom que se saiba que podemos ter jovens e promessas do futebol por aí que, por terem pequena miopia, hipermetropia ou astigmatismo, acabam sendo excluídos ou não tendo desempenho satisfatório.


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